Breeze Rosa

A criatividade é uma aliada de peso no trabalho de um educador musical. Um profissional criativo é capaz de encontrar diferentes maneiras de despertar nos alunos o interesse pela música, de motivá-los a buscar seu próprio caminho, de estudar para superar as dificuldades com imaginação e, principalmente, de fazê-los aprender.

Todas as qualidades acima estão reunidas no livro Musicalização – atividades para bebês e crianças até 4 anos, da educadora musical e flautista Breeze Rosa. Composto por 15 músicas de Breeze e uma série de atividades que abordam diferentes conteúdos musicais, o livro é uma ponte que conduz com maestria ao universo imaginativo dos pequenos.

Além de excelente didata, Breeze também se revela uma exímia cantora. Sua voz é suave, musical e acolhedora. Os músicos que a acompanham e as letras criativas tornam a apreciação prazerosa e divertida.

Vale ressaltar outro ponto alto do trabalho: ele não separa a qualidade estética da educação (algo pelo qual todo educador musical deveria primar, mas que infelizmente nem todos o fazem). A seguir, Breeze fala sobre seu processo criativo, formação de professores, mercado de trabalho e dá algumas dicas para quem deseja trabalhar com crianças.

CONCERTISTA: Como é o seu processo de composição das músicas para a educação infantil? Você se guia mais pela intuição, ou pensa no conteúdo que quer trabalhar para depois criar a música?
Na maioria das vezes, o meu processo de criação é estimulado por algo que eu tenha ganhado, comprado e é, a partir da brincadeira, pensando no que determinado objeto ou atividade podem proporcionar e em qual conteúdo poderia ser trabalhado, que as ideias de letra começam a surgir.

Assim acontece quando estou me divertindo ao piano, por exemplo, e começo a criar uma melodia, então descubro uma harmonia que combine e, aos poucos, vou combinando o objetivo à letra, a harmonia à melodia. Dependendo da música, levo até dois meses para concluir e, desse modo, pensar em como desenvolvê-la para, depois, aplicá-la em aula.

Foi o caso da faixa número 6 (O Golfinho), do meu CD: eu havia comprado pelúcias de golfinho (na época, nem sabia o motivo pelo qual havia adquirido, mas sabia que poderia fazer algo com eles) e, sentada em um banco na praça de alimentação da rodoviária de São Paulo (ao voltar de uma oficina), brincando com a pelúcia, um papel e um lápis na mão, comecei a pensar e a registrar o que poderia fazer. Foi assim, então, que dei início a essa composição.

CONCERTISTA: Quais dicas você daria para quem deseja desenvolver um trabalho de composição para o público infantil?
Antes de qualquer coisa, pesquisar, ouvir e refletir sobre música, principalmente sobre o repertório infantil existente. Analisar as composições a partir dos aspectos musicais, linguísticos e pedagógicos, como, por exemplo, extensão utilizada na melodia, ritmo, prosódia, objetivo pedagógico inserido na canção, conteúdo linguístico (se a letra da música está de acordo com a faixa etária a ser trabalhada), entre outros. 

Também busque participar de oficinas, conhecer de perto o que vem sendo feito pelos profissionais especializados da área. Em seguida, comece pela seleção do estímulo que pretende desenvolver; seja ele corporal, espacial, visual… depois, abra o armário de materiais, ou até mesmo o armário de brinquedos do seu filho, caso o tenha… já criei algumas músicas a partir dos brinquedos e das pelúcias encontrados no armário das minhas filhas (Ana de 4 anos, Nina de 1 ano e 4 meses); então, entregue-se ao mundo da imaginação, da fantasia e, literalmente, brinque, que, aos poucos, as ideias vão aparecendo.

Se tiver um instrumento para fazer parte deste momento, melhor ainda, lembrando de ter em mente o que fazer, como fazer e para que fazer e que, além de estar adequada dentro de todos os aspectos anteriormente citados, a composição também precisa fazer parte do universo lúdico, divertido, criativo e dinâmico, proporcionando um momento prazeroso e estimulante.

CONCERTISTA: Seu livro tem como foco crianças de 0 a 4 anos. Quais conteúdos musicais você considera essenciais serem trabalhados nessa faixa etária?
Todos são, porém a forma como cada conteúdo for planejado e apresentado é que fará toda a diferença no processo pedagógico. Por exemplo, eu posso incluir, no meu planejamento para bebês, uma atividade para trabalhar timbre, porém, neste momento, é importante que esse conteúdo venha apresentado em forma de uma história com a duração de aproximadamente dois minutos, na qual será apresentado às crianças um determinado instrumento, como, por exemplo, a flauta transversa, e mais outros personagens.

Isso porque, embora o principal objetivo seja apresentar o instrumento, nós, educadores, não podemos deixar de lembrar que estamos trabalhando com crianças e, quanto mais significarmos o aprendizado, quanto mais perto do universo infantil adequarmos o conteúdo e a atividade, melhor será o desenvolvimento.

Desse modo, fazem parte da história: a lagarta (representada pelo meu dedo); a borboleta (representada por uma borboleta, parte da fantasia infantil); a árvore (representada por um leque verde de penas) e o sol (representado pelo pandeiro); e acontece um pequeno diálogo entre os personagens, ora tocando, ora contando a história e, ao final, sob a minha supervisão, as crianças têm contato com os instrumentos utilizados na história.

Musicalização para bebês e crianças até 4 anos.

CONCERTISTA: Quais habilidades musicais (e extramusicais) você destacaria que um educador musical precisa desenvolver para trabalhar com as crianças?
São muitas, mas a primeira delas eu diria que é a sensibilidade, para sentir as crianças, o clima da aula, para entender o momento de repetir a atividade ou de simplesmente não fazê-la.

A segunda é, a não menos importante, a tão conhecida e às vezes esquecida, paciência, pois serão muitas as vezes em que, por exemplo, o professor terá que convidar aquela criança que pela terceira, quarta vez resolveu sair correndo, justamente quando estava desenvolvendo uma brincadeira de roda.

E a terceira, a disponibilidade, para pesquisar, refletir e elaborar uma aula, já que, além de cumprirmos com o que é necessário trabalhar dentro de um determinado planejamento, é preciso ser capaz de proporcionar um momento prazeroso, lúdico, divertido, criativo, inteligente e dinâmico, contribuindo para a formação global da criança.

Todas essas habilidades são importantes uma vez que estamos trabalhando com crianças, em minha opinião, com o público de maior responsabilidade (sim, pois muitos deles serão apresentados a conceitos e referências de determinados assuntos pela primeira vez em suas vidas).

Em relação às habilidades musicais, além de estar o mais bem preparado em relação aos aspectos musicais, como melodia, letra, ritmo de todas as canções que for trabalhar com as crianças, é preciso lembrar que, quanto mais seguro estiver diante das atividades, com a forma que for conduzir a dinâmica da atividade, melhor será o desenvolvimento e a resposta por parte dos alunos.

CONCERTISTA: Devido a seus cursos de capacitação e oficinas de musicalização, você tem contato com educadores musicais de todo o país. Quais são os assuntos mais pedidos pelos participantes, e como você observa a formação dos educadores musicais no Brasil?
Em geral, as dúvidas são em relação à elaboração do plano de aula (aliás, um assunto que eu adoro), como, por exemplo, quantas atividades cabem em um planejamento, a partir de quantos anos se pode trabalhar determinada atividade, o que fazer quando determinada criança não quer devolver, e por aí vai.

Os educadores com os quais eu tenho contato, na sua grande maioria, são comprometidos com a qualidade da educação musical, tendo formação superior, seja licenciatura em Música ou superior de instrumento, e estão à procura de novas ideias, repertório e atividades para a sala de aula.

Porém, infelizmente, percebo que existe, ainda, uma parte que atua nessa área por pura falta de opção, porque não conseguiram trabalho como instrumentistas ou dentro da área acadêmica, o que é uma pena para ambos os lados.

Muitos desses profissionais encaram o ensinar apenas como uma forma de ganhar dinheiro e não como uma escolha de profissão, deixando o nível de trabalho em sala de aula muito abaixo do que poderia ser.

CONCERTISTA: O mercado de trabalho oferece boas oportunidades para o educador musical? É possível viver exclusivamente da profissão?
Acredito que sim, porém, devido à baixa remuneração, à custa de muitas horas em sala de aula. Sou formada em Licenciatura em Música pela EMBAP (Escola de Música e Belas Artes do Paraná/ UNESPAR) e, antes mesmo de concluir o curso, estava vivendo financeiramente e exclusivamente dessa área, seja em escolas de música ou em escolas de educação infantil.

Tenho relatos de colegas da turma da faculdade os quais estão com os horários de trabalho todos preenchidos, a maioria atuando em escolas regulares. Porém, é importante perceber que muitos assumem tal carga horária pelo fato de o valor hora/aula ser muito pouco para exercer somente alguns períodos de trabalho.

Hoje, eu percebo que, quanto mais buscarmos desenvolver, nos aperfeiçoarmos e criarmos algo original, maior segurança financeira e liberdade de escolha de oportunidades de emprego teremos.